Entrevistas

Tarcísio chega aos 100 dias de gestão sem mostrar a que veio, diz líder do PT na Alesp

Em entrevista a CartaCapital, Paulo Fiorilo analisa gestão do governador de São Paulo, que se elegeu com apoio de Bolsonaro

O deputado estadual, Paulo Fiorilo (PT). Foto: Alesp
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Passados quase 100 dias de novo governo estadual em São Paul0, a avaliação da oposição é de que o bolsonarista Tarcísio de Freitas (Republicanos) está “sem nada para apresentar”.

Para o deputado Paulo Fiorilo, novo líder do PT na Assembleia Legislativa de São Paulo, Tarcísio não mostrou ainda a que veio.

“Nossa avaliação é que ele não entregou absolutamente nada nesses 100 dias.”, diz ele a CartaCapital. “Ao contrário: é um governo reativo.”

Fiorilo cita como marca negativa de Tarcísio a decisão de fechar o restaurante Bom Prato, no bairro de Campos Elíseos, no centro. O governo alega que o local está em obras.

O petista cita também a promessa ainda não cumprida de instalação de câmeras na região da Cracolândia, critica a nomeação de uma bolsonarista para a Secretaria da Mulher e ironizou a concessão do Rodoanel.

Na segunda-feira 10, o petista participa de um ato político em uma escola estadual do Alto de Pinheiros, com o objetivo de criticar as entregas do mandato.

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). Foto: Rogério Cassimiro/Governo do Estado de SP

Ex-ministro de Jair Bolsonaro (PL), Tarcísio é criticado também por levantar a bandeira de privatizações de empresas como a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo, a Sabesp, e a Empresa Metropolitana de Águas e Energia, a Emae. O PT diz que mobilizará vereadores de mais de 300 municípios para evitar o projeto.

A oposição trabalha pela instauração de uma CPI, após alegar ter sido prejudicada por uma manobra da base governista na Alesp. Uma das propostas é investigar o tiroteio que deixou um morto em Paraisópolis, durante uma visita de Tarcísio na campanha eleitoral.

No entanto, propostas governistas estão mais próximas da instauração, como a CPI que apuraria procedimentos de transição de crianças e adolescentes no Hospital das Clínicas, da Universidade de São Paulo. O pedido é do deputado Gil Diniz (PL).

Na presidência do Legislativo, Tarcísio emplacou André do Prado (PL), homem de Valdemar da Costa Neto e responsável por uma ruptura de 28 anos do PSDB no cargo.

Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista.

CartaCapital: Qual a avaliação que o senhor faz sobre os pedidos de CPIs já protocolados?

Paulo Fiorilo: A maior preocupação é com temas que não deveriam ser da Assembleia. Por exemplo, esse que vai discutir com os médicos do Hospital sobre a questão de gênero. Não cabe a uma Assembleia discutir esse tema, porque deveria ser tratado pela ciência. Qual é o crime ou a irregularidade que existe? Uma CPI é para apurar, para investigar. A gente acaba usando esses instrumentos para fazer uma disputa ideológica.

Na minha opinião, é um equívoco para o estado de São Paulo trazer um debate desse. É uma discussão que está em outro campo, e não o da política, da ideologia, mas da saúde pública.

CC: A fila da CPI foi um revés para a oposição?

PF: A fila faz parte de um processo que a Assembleia vive há muito tempo. O que a oposição via que poderia ser diferente? Que houvesse diálogo entre oposição e situação para que tivéssemos duas CPIs para a oposição e três CPIs para a situação. Mas a base governista optou por outro caminho.

Achamos que foi uma medida equivocada, porque era possível construir o diálogo. E eles radicalizaram, tentando impedir. Vamos continuar insistindo e brigando para que a gente tenha mais uma CPI.

CC: O que muda com o PL na presidência da Alesp?

PF: Primeiro, é uma interrupção de 28 anos [do PSDB]. O deputado André, tanto nas conversas com a oposição como nas falas públicas, tem dito que não quer que a Assembleia seja um puxadinho. Vamos ver na prática se isso vai ser colocado no dia a dia.

Por exemplo, ele está dizendo que ele quer discutir que os deputados tenham mais projetos aprovados. No período do PSDB, a gente quase que não teve projetos aprovados e sancionados. A ideia é tentar mudar essa lógica, para a gente poder apresentar projetos que podem ter sanção. Se implementar, já é uma mudança. Segundo, a possibilidade de democratizar as decisões. Isso muda a postura da Assembleia.

CC: O André do Prado é uma figura a serviço dos interesses do bolsonarismo?

PF: O André é do PL, o mesmo partido do Bolsonaro, mas o André não é bolsonarista raiz. O André é da relação com o Valdemar, tem uma outra postura. O André nunca foi à tribuna xingar o PT ou o Lula. Ele foi parlamentar na cidade dele, prefeito, deputado, ele vem de uma outra história. A gente vai acompanhar qual vai ser a posição dele, mas é diferente se fosse um bolsonarista raiz presidindo a Assembleia, do que o André, que é uma pessoa que tem bom senso e entende a importância do diálogo.

CC: Qual a sua avaliação sobre os primeiros 100 dias do governo de Tarcísio de Freitas?

PF: Tarcísio se elegeu com o mote de entregas, e a nossa avaliação é que ele não entregou absolutamente nada nesses 100 dias. Ao contrário: é um governo reativo.

Reagiu à questão do desmoronamento no litoral norte, agora, do ponto de vista das ações, a gente viu fechamento de Bom Prato no interior e na capital e a ruptura de um convênio com psicólogos para as escolas estaduais, nesse momento tão delicado.

A gente viu uma atitude ruim na greve dos metroviários, porque publicamente disse que era a favor da catraca livre, mas entrou com uma ação para que não houvesse essa possibilidade. Além disso, tinha uma promessa, que era instalar um centro de triagem na Cracolândia, nos primeiros 100 dias. Não instalou. Não instalou as 500 câmeras inteligentes na Cracolândia.

Portanto, é um governo muito aquém do que poderia se esperar nos primeiros 100 dias. Não apresentou um projeto estruturante na Assembleia Legislativa. O único projeto que ele apresenta é para desapropriar área pública para moradias no litoral norte, mas, projetos estruturantes, nenhum.

CC: É um governo bolsonarista?

PF: Eu diria que é um governo que dialoga com o bolsonarismo, mas também dialoga com a racionalidade. É um governo pendular. Ele não pode jogar fora o bolsonarismo, mas ele não quer ser um governo do Bolsonaro, obscurantista, negacionista. Veja, por exemplo, ele sancionar o projeto da cannabis, o que o Bolsonaro jamais faria. Por outro lado, também, colocou na Secretaria de Mulheres uma bolsonarista raiz.

CC: E em relação à privatização da Sabesp? Qual a probabilidade de ser concluída?

PF: É difícil avaliar. Esse projeto da Sabesp não exige quórum qualificado. Portanto, precisa de 48 votos. Eles alegam que há uma base com mais de 60. Agora, essa base não foi testada. Vamos esperar qual a capacidade de ele [Tarcísio] articular os mais 60 deputados que eles dizem que têm. Se ele não conseguir articular, o projeto não vai ser aprovado. E a oposição vai fazer todo o esforço, mobilizando as cidades. São 375 cidades que assinaram convênio com a Sabesp.

Nós vamos organizar os vereadores das cidades para mostrar o risco que é entregar uma empresa que dá lucro. Em 2021, a Sabesp teve mais de três bilhões de lucro, tem um ativo de 57 bilhões, avaliada no mercado em torno de 39 bilhões. Uma empresa que tem cinco empresas fotovoltaicas. Você não está falando de uma empresa qualquer. E é uma empresa responsável por universalizar os serviços de água e esgoto. Em vários lugares do mundo, a gente tem acompanhado a reestatização de empresas como a Sabesp. Na minha opinião, ele está na contramão.

CC: É possível que a oposição se convença de que algum modelo de privatização é possível para a Sabesp?

PF: É possível a gente construir um amplo debate e apontar os riscos de entregar a Sabesp. É preciso que eles mostrem o contrário, para a gente construir consensos. Da forma como está sendo feito, é muito difícil. Nós estamos sempre dispostos a dialogar, mas não a mudar de posição quando diz respeito a uma empresa pública lucrativa e que ajuda cidades pequenas. Uma empresa privada não tem interesse em investir onde não tem retorno. A gente tem visto no mundo aumentar tarifas. O risco é muito grande.

CC: Quais são as prioridades do PT nessa legislatura?

PF: O PT faz, na segunda-feira 10, um seminário para discutir as prioridades. A gente quer fazer um diagnóstico do governo Tarcísio nesses 100 dias e apresentar um pouco onde a gente vai focar. Possivelmente, a gente vai focar nessa questão das privatizações da Sabesp, da Emae e das rodovias e ferrovias. Queremos colocar uma lupa e denunciar caso a caso, além da questão da educação, da saúde e da fiscalização orçamentária.

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