Augusto Diniz | Música brasileira
Jornalista há 25 anos, Augusto Diniz foi produtor musical e escreve sobre música desde 2014.
Augusto Diniz | Música brasileira
Os 50 anos de Nervos de Aço, álbum da excelência musical de Paulinho da Viola
Disco do cantor e compositor lançado em 1973 vai do samba-canção ao choro com ousadia e proeminência
A capa produzida pelo mestre Elifas Andreato, morto ano passado, dá a sensação de o álbum Nervos de Aço ser um tanto melancólico, já que mostra o seu autor em lágrimas. Paulinho da Viola vivia, de fato, um momento um tanto tristonho na vida privada – era recém-separado.
Mas, ouvindo as faixas do registro, percebe-se um Paulinho da Viola mais preocupado em produzir algo relevante e sofisticado sem ser presunçoso. O disco de 10 faixas é uma obra-prima e mostra também a diversidade musical do cantor e compositor.
O álbum abre com Sentimentos, pinçada entre aqueles compositores anônimos de sua escola do coração, Portela, mestres no fazer do samba tradicional. Seu compositor: Mijinha. Comprimido, a segunda faixa, letra e melodia com a marca indelével de Paulinho da Viola, de um cronista do universo do mundo do samba.
A seguir, o samba para frente também típico de Paulinho, exaltando a Portela, na música Não Leve a Mal. O portelense tem a característica de fazer sambas com andamentos mais rápidos, sem deixar em nenhum momento que as palavras sejam atropeladas – essa terceira faixa é um exemplo disso, com a letra caminhando com a melodia.
Depois, a faixa-título, o samba-canção de Lupicínio Rodrigues, com dores de amor e Paulinho da Viola se mostrando um cantor de expressividade. Encerra o lado A Roendo as Unhas, um samba que propõe uma leitura orquestral do gênero muito ousada – e muito bem realizada. A composição, na forma em que foi feita a melodia, é quase uma revolução sambística, sem lhe tirar a veia do ritmo.
Virando o disco para o lado B – estamos falando de um álbum lançado há 50 anos em vinil -, há outra pérola resgatada dos mestres do gênero. Não Quero Mais Amar a Ninguém, de Zé da Zilda, Carlos Cachaça e Cartola (que lançaria seu primeiro disco no ano seguinte, aos 65 anos), é da maior estirpe musical.
Nega Luzia é da mesma categoria da anterior, de Jorge de Castro e do grande Wilson Batista. A terceira faixa do lado B é outra ousadia melódica e harmônica de Paulinho: Cidade Submersa, um mergulho no sentimento do autor.
Paulinho dá na sequência a sua versão para Sonho de um Carnaval, de Chico Buarque, mais lenta e introspectiva. O disco fecha com Choro Negro, uma das músicas mais importantes da obra de Paulinho da Viola (composta por ele e por Fernando Costa). O choro é simplesmente deslumbrante e está entre os principais do gênero compostos no País.
Destacam-se ainda no álbum Nervos de Aço os arranjos de Lindolfo Gaya, Copinha, Cristóvão Bastos, Nelsinho (Nelson Martins dos Santos) e do próprio Paulinho. Um discaço bem produzido e executado.
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