COP26: ação e ambição na cúpula mais decisiva, escreve Marina Grossi

A sociedade brasileira amadureceu. Está pronta para uma retomada pós-pandemia baseada na economia de baixo carbono

Fachada do Glasgow Science Centre, que hospeda a “Green Zone” da COP26, na Escócia
Copyright Fredrika Carlsson (via Unsplash)

Novembro começa com um encontro de fundamental importância para o nosso futuro. É a COP26, a 26ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima.

Nos próximos dias, vamos acompanhar, direto de Glasgow, Escócia, as negociações entre os países e seus desdobramentos, que definirão o quanto estamos agindo para evitar o aquecimento global, de acordo com os objetivos traçados em 2015 no Acordo de Paris –ou seja, descarbonizar nossas economias com o objetivo de evitar que a temperatura global se eleve acima de 2ºC em relação à era pré-industrial.

Essa conferência tem sido apontada por muitos como “a COP das COPs”, que ditará o passo da corrida rumo à economia verde, de baixo carbono. É preciso agir rápido: o recente relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), lançado no início de agosto, nos mostra que o mundo já elevou a temperatura em 1,09ºC e é prevista uma alta entre 1,5°C e 2°C já nas próximas duas décadas, ou seja, mais cedo do que apontavam as avaliações anteriores.

Esse senso de urgência é reforçado pelos efeitos das mudanças climáticas que já estamos sentindo inclusive no Brasil, com extremos que nos levam a uma crise hídrica e energética sem precedentes. O país sempre foi visto como um ator de posições arrojadas nas conferências climáticas, de forma que é preciso resgatar nosso protagonismo e levar na bagagem para Glasgow os dois ingredientes imprescindíveis para o sucesso da COP26: a ambição e a ação.

Mais do que divulgar compromissos ambiciosos para redução das emissões de gases de efeito estufa, países e empresas precisarão mostrar como pretendem chegar lá, como tornar as metas anunciadas factíveis. Não bastam apenas boas intenções nem condicionar a ação a mecanismos externos de financiamento. Podemos e devemos fazer mais.

Nesse sentido, o setor empresarial brasileiro fez sua lição de casa e está se posicionando de forma contundente em relação à sua responsabilidade na transformação para uma economia de baixo carbono. Em 27 de setembro, lançamos o posicionamento Empresários pelo Clima. Assinado por 115 CEOs de empresas e 14 presidentes de entidades setoriais, ele verbaliza nosso compromisso com a neutralidade climática e a necessidade de o Brasil adotar uma postura mais ambiciosa na COP26. A lista de signatárias engloba setores como agronegócio, alimentício, aviação, elétrico, farmacêutico, finanças, infraestrutura, logística, papel e celulose, petroquímico, saúde, tecnologia, telefonia e varejo.

Entendemos que o Brasil tem vantagens comparativas extraordinárias na corrida para uma economia de emissões líquidas de carbono neutras, valendo-nos dos nossos múltiplos recursos naturais e da capacidade de nosso povo. Para além da retórica, as empresas brasileiras estão empenhadas em promover mecanismos que tornem possível essa transição. Um desses instrumentos é a regulamentação do Artigo 6 do Acordo de Paris: o Brasil precisa adotar uma postura mais construtiva nas negociações sobre esse item, que possibilitará a criação de um mercado regulado internacional de créditos de carbono. O pleno funcionamento desse artigo é estratégico para o Brasil, que será responsável por grande parte dos créditos negociados nesse mercado. Segundo nota técnica do CEBDS, isso poderá fazer com que o país fature até US$ 72 bilhões até o fim da década.

É preciso ainda adotar regras que possibilitem o desenvolvimento de mercados de carbono voluntário e regulado no Brasil –o CEBDS vem capitaneando essa agenda desde 2016 e, neste ano, contribuímos de modo substancial para a construção do Marco Regulatório para o tema. Ao projeto de lei 528, que está atualmente em discussão no Congresso, propusemos uma emenda substitutiva que contempla recomendações ativas de empresas associadas. Em nossa visão, o mercado regulado pode funcionar em paralelo à criação de um mecanismo de registro do mercado voluntário, com ambos coexistindo e créditos do mercado voluntário podendo ser utilizados no sistema regulado. Paralelamente, há uma corrida pelo tema dentro do país, com Estados como São Paulo e Espírito Santo buscando construir sistemas próprios de mercado de carbono.

A sociedade brasileira amadureceu e está pronta para uma retomada pós-pandemia baseada na economia de baixo carbono e inclusiva, com menos desigualdade e melhores condições de vida para todos e também as próximas gerações. A economia verde é boa para todos: para os brasileiros, para os negócios, para o país. Ela gera empregos e renda, melhora a qualidade do ar, faz melhor uso da água, reduz a poluição, mantém nossas florestas em pé e preserva nossa biodiversidade. É hora de arregaçar as mangas e mostrar, em Glasgow, quais os rumos que o Brasil quer trilhar.

autores
Marina Grossi

Marina Grossi

Marina Grossi é economista e assumiu a presidência do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) em 2010. Em 2018 e 2019, integrou o steering committee da Carbon Price Leadership Coalition (CPLC), conselho diretivo da coalizão do Banco Mundial voltada para a precificação de carbono, e atualmente integra o Conselho do Instituto Neoenergia, Fundo JBS Amazônia, Global Reporting Initiative GRI, entre outros. Atuou como negociadora do Brasil na Conferência das Partes (COP) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP do Clima) de 1997 a 2001, e como coordenadora do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas de 2001 A 2003. Participou das negociações do Protocolo de Kyoto.

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